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PREFEITURA DE ALAGOINHAS APOIA O FÓRUM DE DEBATES QUE SERÁ REALIZADO PELA JUVENTUDE PRETA

Por não encontrar no movimento estudantil um espaço para discutir e encaminhar sua vivência como mulher preta da periferia de Alagoinhas, bem como para ensejar uma atenção dedicada à trajetória e à realidade da população negra, mesmo em um estado como a Bahia, Ana Gonçalves resolveu, junto com alguns amigos, em 2018, criar o Fórum da Juventude Preta de Alagoinhas. Esse ano o encontro de jovens de diálogo e de criticidade vai para sua quarta edição e ocorre nos dias 15, 16 e 17  de setembro. No início, contou com a colaboração  do Campus II da Universidade Estadual da Bahia (UNEB) e da própria reitoria. Obteve o apoio  também da Diretoria de Reparação Racial, da Secretaria Municipal de Assistência Social – Semas.

O  grupo de organizadores, ampliado a partir de cada evento, vai debater novos temas com a parceria das Secretarias de Cultura, Esporte e Turismo (SECET) e Secretaria de Educação (SEDUC). Serão inseridas discussões sobre  Juventudes, mulheres e a prática democrática. Em uma Tenda destinada aos estudantes secundaristas, haverá um debate sobre “Estudantes em luta: Um outro Brasil é possível “.

Espera-se um público de 500 pessoas, com participantes  de toda a região. A receptividade desse momento de reflexão tem crescido gradativamente. Em 2018,  o público foi de 80 jovens. No segundo ano, em Serrinha, compareceram 250 estudantes, em 2019; obteveram-se 500 participações em sua versão online em 2021.  Esse ano, o Fórum vai ser encerrado com uma mesa temática  sobre as Mulheres de Terreiro e Indígenas: poder feminino e protagonismo sociopolítico e com um Xiré (comemoração), no terreiro Ilé Áxé Óia Ni, de mãe Olga.

Ana Gonçalves considera fundamental a participação do movimento secundarista. Hoje, graduada em História, ela atua como professora da rede e nota o quanto o jovem estudante do ensino médio tem a ganhar fazendo parte desse tipo de atividade, por trazer elementos sobre sua história e sua cultura, mostrando que é possível e saudável acolher todas diferenças, considerando-as complementares. Ela, que faz parte do Conselho de Reparação Racial do município, fica também satisfeita de ver que participantes do primeiro encontro ingressaram na universidade e estão atuando nos movimentos identitários. É possível também ter a presença marcante de moradores das três comunidades quilombolas da cidade, já que a professora Ana faz parte do núcleo de Educação Quilombola da SEDUC.

A primeira edição do fórum, em 2018, ocorreu em um momento marcado pela morte de vários estudantes pretos, como Felipe Doss, que também era homossexual, de Marielle Franco, e de 12 jovens chacinados no Cabula em Salvador. Por isso, na estreia se discutiu como tema principal a violência sofrida pela população preta no país, com números que podem e são interpretados como uma chacina silenciosa, distribuída por todo território nacional, por isso invisível.

Segundo Gonçalves, o intuito desse debate  foi mostrar e registrar essa crueldade institucional, dizendo: “Estado, estamos aqui, e estamos sendo chacinados”. As estatísticas comprovam o que esses estudantes estão percebendo. Segundo estimativas da Disoc/Ipea, a partir de dados do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus), em 2000, a taxa de vítimas de homicídio de jovens negros era de 74,1 por 100 mil habitantes, bastante superior à observada para os brancos da mesma idade, de 41,8 por 100 mil habitantes.

O percurso de luta  da população preta no Brasil, segundo Ana Gonçalves,  foi e continua sendo pautado pela busca do reconhecimento de direitos, do respeito à diversidade e valorização do pertencimento cultural. Isso está vivo no Movimento Negro, quando toma consciência que historicamente  se desenvolveram mecanismos com a finalidade de oprimir a população preta, gerando preconceito e  exclusão. Essa parcela da população claramente não foi amparada por ações de governo e pelo sistema de leis que garantissem direitos elementares como a educação, saúde, habitação, oportunidade igualitárias no mercado de trabalho. O que existe hoje, avalia a professora, “foi fruto de muita luta nos últimos 50 anos, mesmo assim se percebe uma má vontade por parte dos entes públicos de agilizar práticas reparatórias e de justiça racial, como se percebe na questão da violência, que é resultado de todas as deficiências já apontadas”.

Quando analisados os dados referentes a condições de vida dos jovens negros, não se pode deixar de enfrentar a questão que se explicita: o amplo e diversificado panorama de manifestações da discriminação racial presente nas comunidades e bairros onde a maioria preta habita. Todos esses elementos geram um contexto perverso.  De um lado, constata-se um ambiente escolar nada atrativo para os negros, que promove  alta evasão ou torna  a vida escolar mais irregular; de outro, as dificuldades para a inserção  no mercado de trabalho, sobretudo quando se demanda certo grau de especialização.

No final, observa-se uma realidade de segregação institucional. Esse quadro não favorece a esperança,  não ajuda a se ter uma visão otimista do futuro. A autoconfiança é diminuída, a meritocracia passa a ter um significado de exclusão, pois o tratamento será sempre  diferente para os jovens pretos. Existe tendência ao desânimo, mas os movimentos culturais estão dando respostas de resistência e reversão. Assim é que a juventude preta se coloca e cria seus instrumentos de enfrentamento. A existência e sucesso do fórum é um grande exemplo disso.

 

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